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quinta-feira, setembro 11, 2014

E assim os favoráveis ao aborto aproveitam as tragédias...


Uma das coisas mais pitorescas com a questão do aborto no Brasil é a qualidade do debate. Os abortistas, da mesma forma que espertamente dizem que querem que a sociedade debata o assunto, são os que interditam qualquer tipo de debate, ou, quando isto não acontece, o que eles têm a dizer sobre a questão ou é irrelevante ou trata-se apenas de clichês requentados.

Foi o que aconteceu nesta quinta-feira na edição do jornal O Globo com a coluna da jornalista Cora Ronái, "O lado B da democracia". Eis o trecho infeliz:

"Não sei o que acho pior: uma candidata que é abertamente contra o aborto, uma candidata que não tem coragem de dizer que não é ou um candidato que se diz satisfeito com a nossa legislação obscurantista. As três posições se equivalem. Estamos em pleno ano de 2014, Constantinopla caiu em 1453 e, não obstante, continuamos gastando tempo e energia com essa discussão bizantina.  
Fazer ou não fazer aborto é questão de foro íntimo. Quem for contra aborto que não aborte, mas não queira impor as suas convicções ao resto da sociedade. Sabemos onde isso vai dar: aí está essa pobre moça sumida, obrigada pela excelente legislação em vigor a procurar criminosos para se livrar da gravidez indesejada."

O que é pior mesmo é uma jornalista achar que a liberação do aborto trata-se de uma discussão bizantina. Entende-se o recurso retórico pueril de utilizar conhecimentos do ensino ginasial -- provavelmente ela esperou a vida inteira para conseguir colocar a data da queda de Constantinopla em um de seus textos --, mas ela dizer que a discussão sobre o aborto é bizantina é apenas sinal de sua ignorância sobre o assunto.

Se os candidatos A, B e C preferem desconversar sobre o assunto o problema é a falta de seriedade com a qual este assunto e outros mais são tratados no Brasil e um exemplo perfeito disto é exatamente este texto de Cora Ronái. Ao dizer que "as três posições se equivalem" a jornalista só contribui para a confusão que reina. É evidente que ela procede assim porque tem uma agenda, que para ela a única coisa que parece valer é a liberação total do aborto. 

Se fazer ou não aborto é uma questão de foro íntimo, assassinar ou não assassinar também é. Corromper ou não corromper também. Idem para sequestrar ou não sequestrar. Cora Ronái vai ter peito para levantar estas bandeiras também? Por coerência, devia ter, não é mesmo? Ela devia, por exemplo, defender o direito de um assassino matar suas vítimas e bradar contra quem acha isto absurdo, pois, afinal, não se deve impor convicções ao resto da sociedade, certo?

O problema com este "argumento" da jornalista é que ela assume que o que está no ventre da mãe é nada, o que é desmentido pela própria ciência, que afirma que a vida humana começa na concepção. E aí, será que ela vai querer ir contra o que a própria ciência já sabe sobre Embriologia Humana? Ou será que Cora Ronái, mesmo sabendo (e ela sabe... ah, se sabe...) que já existe um ser humano no ventre da mãe, pouco se importa com este detalhe? Aí então ela deveria abordar a questão sobre um outro prisma: deveria explicar por que, segundo sua sapiente ótica, seres humanos frágeis e inocentes devem morrer pela conveniência ou vontade de outros. O que justifica que um ser humano mate outro, sendo este frágil e inocente, que sequer tem voz para clamar por justiça? E já que ela é afeita a fatos aprendidos em aulas de História do ginásio, seria ótimo se ela listasse as vezes na história em que tais atitudes tomaram forma de regimes totalitários e deixaram em seu rastro o sangue de milhões de inocentes.

Mas como os favoráveis ao aborto sempre que sentem o cheiro de carniça ficam em polvorosa, a jornalista aproveitou a deixa e tenta colocar na conta da legislação ainda restritiva ao aborto o caso da jovem Jandira Magdalena Cruz, que desapareceu, segundo informações, após ter entrado em um carro que supostamente a levaria para uma clínica de abortos na Zona Oesto da cidade do Rio de Janeiro. Cora Ronái diz que nossa "excelente legislação" obrigou Jandira "a procurar criminosos para se livrar da gravidez indesejada". Sério? Da última vez que li o Código Penal, não havia nenhuma obrigação de fazer aborto para quem quer que fosse. Na verdade, a punição que ali vai tem a intenção exatamente contrária: fazer que a pessoa tome consciência da gravidade do ato cometido, que é a eliminação de uma vida humana.

Está bem que a jornalista mais uma vez usava de um recurso retórico para puxar a brasa para sua sardinha, isto está claro. Geralmente quem apenas quer que sua opinião prevaleça usa de tais expedientes, mas a verdade, porém, a verdade nua e crua, é que a jovem procurou criminosos que atentam contra a vida porque também ela procurava cometer um crime contra a vida. É evidente que seu desaparecimento e possível morte é uma tragédia, e é exatamente este tipo de tragédia que é evitada por quem não procura cometer o crime do aborto. Vem daí que querer usar tal caso como forma de alavanca para a liberação do aborto é um salto enorme e uma instrumentalização pura e simples da tragédia alheia.

A coisa torna-se ainda pior quando vemos que o desaparecimento da jovem é uma sucessão de erros. Segundo depoimento de seu ex-marido, Leandro Brito Reis, que foi quem a levou até o terminal rodoviário onde Jandira entrou no carro que a conduziria para a clínica de abortos, “Ela se envolveu com um homem, engravidou e queria tirar. Quem indicou a clínica foi uma amiga dela de infância, que disse que uma outra amiga, que teria feito um aborto nesse mesmo lugar, tinha sido muito bem tratada". Pois é... A jovem, segundo informações de sua mãe, estava para reatar o relacionamento com o ex-marido:  "Ela disse pra mim: 'Eu conversei com o Leandro e, depois que a gente resolver o que a gente disse que ia fazer (o aborto), a gente vai ver se recomeça tudo de novo'. Foi isso que ela me disse". A mãe da jovem contou também que Jandira e o ex-marido brigavam muito e se agrediam quando estavam juntos.

Ou seja, o quadro que se tem é negro. Uma jovem que estava em um relacionamento abusivo, já tendo sofrido agressões (que foram motivos de queixas à polícia), termina o relacionamento, envolve-se com uma outra pessoa, engravida e depois resolve voltar para o ex-marido. Para que o relacionamento tenha um recomeço, eles resolvem abortar a criança fruto do relacionamento anterior de Jandira. Para conseguir o aborto, uma amiga de infância indica a ela uma clínica e a jovem acaba nas mãos de criminosos que iriam matar seu filho não-nascido.

É tanta coisa errada que fica difícil alguém imaginar como Cora Ronái teve a capacidade de tentar jogar para a legislação restritiva ao aborto (e por tabela, claro, a quem é contrário a esta prática) a culpa por tudo isto. Jandira não teve forças necessárias para sair totalmente de um relacionamento que lhe era abusivo, seu ex-marido tampouco teve a dignidade de saber que o que estava no ventre de sua ex-esposa era um ser humano que devia ser preservado e não que ele ajudasse a matá-lo, e a tal "amiga de infância", ao invés de realmente apoiar sua amiga e lhe mostrar o erro em que estava se metendo, resolveu encaminhar Jandira para as mãos de criminosos. Some-se a tudo isto que os acusados pelo desaparecimento, segundo informações, são dois policiais que já haviam sido acusados de crime de aborto em outros casos, e que agora, somente agora,  foram colocados em funções administrativas e responderão a processo disciplinar. Também está envolvida uma técnica de enfermagem que já havia sido acusada pela prática de aborto em três outros processos!

E o mais triste de tudo isto é saber que aqueles que estavam ao redor de Jandira -- o ex-marido, sua "amiga", familiares --, não foram capazes ou não se interessaram em demovê-la da idéia ou mostrar-lhe alternativas que ela talvez não conseguisse enxergar naquele momento. Enfim, uma tragédia completa. 

É esta tragédia que gente como Cora Ronái procura instrumentalizar para a causa abortista alegando, de forma simplória e fútil, que Jandira queria apenas se "livrar de uma gravidez indesejada"? Sua própria escolha de palavras ("livrar"?), já indica o que ela acha de uma gravidez, preferindo ignorar o ser humano já concebido. Não é à toa que ela acha bizantina a discussão sobre o aborto, é porque ela parece nem sequer entender o que há de importante e o que está envolvido na questão, e assim a melhor alternativa parece ser escrever de forma superficial e aproveitar tragédias alheias.



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