Nada há como um bom slogan! Faz a fortuna dos publicitários; faz a alegria dos manipuladores; faz a cabeça dos incautos. Tem gente que acha que para qualquer problema é só tirar da cartola um slogan e ... ZAP! Provei meu ponto! Discussão encerrada!
Felizmente, não funciona assim. Um slogan pode ser muito bom, mas será que ele é ético? Esta é a questão! Todo slogan é uma síntese, um amálgama de uma série de idéias e conceitos, que são postos em relevância por algumas poucas palavras cuidadosamente escolhidas e carregadas de alto significado.
Até aqui, tudo bem. Mas e quando estas poucas palavras pretendem, na verdade, mascarar a realidade? E quando um slogan põe em evidência determinados direitos em detrimento de outros, de igual valor? E quando um slogan é nitidamente manipulador? Ou simplesmente mentiroso? Aqui começa o problema. Um grande problema, que fica cada vez maior quando mais e mais pessoas caem - os tais incautos - na teia de manipulações baixas, até o ponto do slogan ser repetido como um dogma.
Ai de quem resolver ir contra tais slogans!
Meu corpo me pertence
Em tempos politicamente corretos como os em que vivemos, a repetição de slogans virou mania. Para que pensar, se temos um slogan fantástico à mão? Para que desenvolver um pensamento coerente e lógico, quando se tem a possibilidade de, através de tais palavras mágicas, tomar um atalho e emitir uma opinião como se fosse altamente fundamentada?
É o caso do slogan "Meu corpo me pertence", que é usado e abusado por certos indivíduos e grupos abortistas. Estas 4 palavras exprimem o óbvio, mas a significação que lhes está sendo dada já extrapolou, em muito, o que elas dizem. É neste ponto que os incautos entram no barco já em movimento e participam de uma manipulação pura e simples.
"Meu corpo me pertence" é um baita slogan, devemos reconhecer isto antes de mais nada. Traz consigo uma afirmação de individualidade fortíssima, uma independência fulgurante. É, assim parece, uma atitude de quem enfrenta a vida de frente. É o slogan dos fortes! É o mantra dos decididos! É a palavra do homem e da mulher que são senhores de si, que andam de cabeça erguida no meio da multidão!
Bem... Bem... O problema vai no que tal slogan esconde, no que ele deforma, no que ele distorce. É muio bonito, muito "moderno" bradar tais palavras, mas será que as mesmas pessoas que tiram tal slogan da cartola estão preparadas para sustentar toda a significação de tais palavras? Que darão aval a tudo o que elas escondem, distorcem? É bom que estejam, pois do contrário serão apenas papagaios a aumentarem o barulho, mas que nada sabem do significado do que gritam.
Slogan esquecido?
Uma blogueira, há algum tempo atrás, achou por bem começar seu post exatamente com este slogan, tomando por "deixa" o "Dia Internacional da Saúde". Bem ao contrário do que ela alega, o referido slogan não foi nem esquecido e muito menos "satirizado nas últimas décadas", ele continua seu papel na farsa para o qual foi criado. E muito bem, pelo jeito. É só reparar em como ela utiliza-se do mesmo.
Inicia falando sobre amamentação como um direito e não como um dever. Justíssimo, apesar de óbvio... Dizer que "a escolha deve ser, sempre, da mulher e tem que ser respeitada" é cair no óbvio. É óbvio porque apesar de já mais do que comprovados os benefícios deste ato, uma mulher pode sempre desejar que seu filho não seja amamentado. Apesar de não concordar com uma abordagem que em momento algum toca no papel do pai - o que simbolicamente tem significância quando lemos o restante do post -, concordo que amamentar ou não jamais deva ser uma obrigação. E quem discordaria disto?
Omissões e distorções
A distância entre amamentação e aborto é enorme. Uma é a chave para o desenvolvimento saudável de uma criança e o outro é a eliminação de uma criança. Apesar desta distância "oceânica", a blogueira faz a transição entre um assunto e outro como quem pula uma poça d'água. Tudo, claro, a pretexto de que à mulher pertence o seu corpo. Coisa, aliás, que ninguém nega. Quando se insiste que não é lícito o aborto, não é porque se está dizendo que o corpo da mulher pertence a quem quer que seja, é desviar do assunto quem assim tenta emocionalizar o debate. À mulher pertence seu próprio corpo, isto é claro para as sociedades democráticas. Também ao homem pertence seu próprio corpo... E também ao ser humano em formação pertence seu próprio corpo!
Eis o que omite, espertamente, o tal slogan: há um ser humano independente da mãe a partir da concepção. A "humanidade" deste ser só faz sentido se pensada de forma independente da de sua mãe. Querer que a "humanidade" de quem quer que seja esteja condicionada à suposta decisão de sua mãe, é absurdo e bizarro, trazendo à nossa mente as atitudes de regimes autoritários que se utilizam exatamente deste tipo de expediente como caminho para a submissão e extermínio de seus desafetos. Às mulheres foi dada a Graça - é sempre Graça! - da maternidade, mas de maneira nenhuma a elas foi dado poder para decidir se ou a partir de qual momento a seu filho é humano.
É a partir da distorção que vai implícita em tal slogan que a Deputada Jandira Feghali pôde confeccionar um substitutivo que, na prática, permite o aborto a qualquer momento da gestação. É distorção, pois o que tal slogan cria é um nítido desequilíbrio entre o direito da mãe e o direito do filho ainda não nascido. Tudo isto porque o que se tira do slogan não diz respeito à individualidade, é apenas individualismo e egoísmo.
Nem ela acredita que não é crime...
Diz a blogueira que "aborto não é crime". Mas será que ela mesma acredita nisto? A julgar pelas suas próprias palavras, não. Vejamos:
"O aborto é, sempre, um ato extremo, que vem carregado de algum nível de sofrimento, da impossibilidade de se materializar a maternidade naquele momento, de dor, de um sentimento de perda."
Qual seria o sofrimento se no ato de abortar não houvesse exatamente uma fatal resolução sobre o destino de um ser humano? De onde viria o "sentimento de perda"? Da perda de um "punhado de células", como dizem pejorativamente muitos abortistas? Se a blogueira achasse que se trata apenas de um "punhado de células" por que ela tenta se mostrar compreensiva com a dor emocional das que são "obrigadas" a abortar? Ela inadvertidamente deu ao fruto da concepção o status que os pró-vida sempre lhe dão: é um ser humano!
Apesar de, na prática, reconhecida a humanidade do embrião, ela diz que:
"(...) muitas vezes aquela mulher que tem uma gravidez indesejada - por várias razões que só a ela cabe julgar - pode não ter opção e decidir que precisa interromper a gestação."
Este é o grande problema... A um ser humano inocente, indefeso, ninguém tem o direito de interromper a vida! Não é o fato de uma mulher desejar ou não ficar grávida que dá "humanidade" ao feto, e, por isto, não é lícito que seja decidida a interrupção de uma gestação.
Continuando, a blogueira escreve que:
Continuando, a blogueira escreve que:
"(...) a mulher perde mais o controle do seu próprio corpo, que passa a ser, de certa forma, apropriado pelo Estado e pela Igreja."
Ah... As mentes eternamente confusas...Que delícia deve ser trazer assuntos mil à tona, sem jamais pensar 1 minuto que seja em qualquer um deles. O controle sobre seu corpo continua pleno às mulheres nas sociedades democráticas, porém tal controle de forma nenhuma é estendido ao fruto da concepção. Aliás, faltou a blogueira dizer como o Estado e a Igreja apropriam-se do corpo da mulher. Jogar palavras assim ao vento - palavras fortes - e nada provar, de que adianta?
Nosso velho amigo, Dr. Carandiru
Como não podia faltar, há referência no post ao Dr. Carandiru, que a cada dia que passa torna-se uma griffe mais e mais famosa. O doutor não discute, ele dogmatiza. O doutor não ouve ninguém, ele tem todas as soluções para os problemas. A blogueira, pelo jeito mais uma fã do doutor, reproduziu um trecho de uma de suas entrevistas:
"(...) "O aborto no Brasil é absolutamente livre para quem tem dinheiro. Só as moças pobres não têm acesso. Nós temos no Brasil um número absurdo de meninas que vão fazer curetagem em hospitais públicos para tratar complicações de aborto. Temos 200 mil abortos no Brasil. É um problema médico. Não pode ser tratado por marginais. Acho que o aborto pode ser feito até três meses de gestação, esse é um número razoável, pois nesse período o feto não tem atividade cerebral. Não adianta querer proibir.""
O aborto, apesar do Dr. Dráuzio dizer que é livre para quem tem dinheiro, é crime no Brasil, não tem nada de livre. Se determinada parte da população pensa que devido às suas melhores condições financeiras estão acima da lei, os governantes devem redobrarem os esforços para que a Lei seja cumprida. Acaso devemos liberar também a sonegação fiscal? Todos sabemos que os pobres são os que menos sonegam impostos em nosso país, enquanto que os ricos são mestres nesta arte. O doutor acha também que este crime deve ser tolerado e até mesmo liberado para que se tenha uma "igualdade" entre ricos e pobres?
O doutor diz que é um problema médico. Não, não é um problema APENAS médico. É um problema multi-facetado, no qual várias áreas do conhecimento são chamadas a darem sua contribuição. Falar que o aborto é um problema apenas médico é querer setorizar o assunto exatamente para eliminar os argumentos contrários a esta nefasta prática. O doutor diz que o aborto "não pode ser tratado por marginais". Muito bem... Os tais "marginais", muitos deles, são exatamente os médicos que se prestam ao papel de eliminar uma vida humana. Todos deveriam estar na cadeia, pois eles, mais do que ninguém, sabem muito bem o que estão fazendo.
O doutor acha que o aborto pode ser feito dentro do prazo de 3 meses, pela falta de atividade cerebral no feto. Ele pode "achar" muita coisa, mas talvez ele devesse explicar qual a diferença entre um feto com 12 semanas e um outro com 11 semanas e 6 dias. Já que ele quer mesmo utilizar tal critério para decidir se um aborto é ou não lícito, ele talvez devesse explicar qual o exato momento mágico no qual o feto ganha a sua "humanidade" como um presente, uma dádiva da ciência médica. Talvez o doutor devesse combinar o discurso principalmente com as "feministas" radicais, para quem o aborto é um "direito" que pode ser exercido a qualquer momento durante uma gravidez, nem que seja 1 hora antes do parto. Para tais "feministas" o doutor seria tachado de "machista" para baixo, pois, diriam elas, quem é ele para decidir uma coisa que só às mulheres cabe decidir?
Ilusões
Depois de dar voz ao Dr. Drauzio Varella a blogueira emite sua opinião:
"(...) Como disse o Dr. Dráuzio, não adianta querer proibir, o aborto vai sempre acontecer e nas piores condições, enquanto for visto como crime."
Faltou o discernimento tanto a ela quanto ao doutor de que o tal critério por ele criado - o de 12 semanas - em nada vai impedir que um aborto aconteça nas piores condições. Caso uma mulher perca o prazo de abortar, ela docilmente aceitaria a gravidez? Óbvio que não... Mesmo que todos os médicos por ela procurados para resolver o seu "probleminha" se recusassem a efetuar o procedimento, uma tal mulher se conformaria? Duvido muito... Aliás, posso até visualizar uma mãe pedindo ao médico para dar um jeitinho dizendo "coloque na ficha que estou com 11 semanas, ninguém saberá mesmo...". Tanto o doutor quanto a blogueira parecem querer fechar os olhos a uma tal realidade, enxergam o que querem ver...
Visão seletiva
Finalizando seu post, a blogueira noticia a instalação da tal Comissão Tripartite (é um post já antigo), formada por membros do executivo, do legislativo e da sociedade civil. Diz ela, também, que a comissão já começa "sob a ameaça da Igreja". A blogueira tem uma forma peculiar de enxergar o mundo. Seletivamente, ela escolhe o que lhe é mais palatável. Ela não se mostra indignada que a Igreja tenha sido totalmente alijada de um debate, mas aceita de bom grado que uma entidade como as "Confusas pelo Direito de Decidir" faça parte da comissão, mesmo que esta, a começar de seu próprio nome, procure apenas desinformar para impor a sua agenda.
Contradizendo-se, a blogueira termina: "(...) Aborto é questão de saúde pública e deve ser visto como tal". Ela poderia muito bem explicar como uma questão que é meramente de saúde pública pode ocasionar, segundo suas próprias palavras, "sentimentos de perda". Ou ela trata o problema como ele realmente é, multifacetado, complexo, ou ela simplesmente reduz o problema aos seus desejos - no caso, de saúde pública -, mas que pelo menos seja coerente com o seu próprio discurso. Des-humanizar o concepto quando seus interesses assim exigem e aceitando-lhe a humanidade quando conveniente para um discurso emocional só demonstra a quantas anda a confusão de tais pessoas, e é nisto que caem os que insistem em argumentar com slogans já mais do que batidos.
Um comentário:
interessante... uma dissertação com um conteúdo digno de se pensar,acabo de imprimir o texto com a intenção de ler e analisar mais calmamente suas questões,obrigada por contribuir com uma opinião clara e bem posicionada diante de tantas contradições sobre o tema.
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