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sábado, setembro 26, 2009

De golfinhos humanizados e bebês animalizados


Um amigo meu recebeu um destes e-mails de corrente de protesto. O motivo? Este: a matança de golfinhos nas Ilhas Faroe.

Na mensagem, vinham anexadas algumas imagens "chocantes" de habitantes das Ilhas Faroe participando da "matança" dos pobres animais. As imagens do evento, dada a comoção que causou, podem ser vistas em vários sites. Quem se interessar, poderá vê-las através de uma simples busca no Google.

Ao final da mensagem, uma penca de nomes de pessoas que já haviam encaminhado a mensagem para seus contatos fazendo campanha contra aquela "crueldade". É necessário dizer que às imagens somavam-se frases como:
"O mar se tinge de vermelho, entretanto não é devido aos efeitos climáticos da natureza. Se deve a crueldade com que os seres humanos (ser civilizado) matam centenas dos famosos e inteligentíssimos Golfinhos Calderón."
Ou:
"Deste massacre participam principalmente jovens. Por que? Para demonstrar que estes mesmo jovens já chegaram a uma idade adulta, estão maduros."
Ou ainda:
"Eles não morrem instantaneamente, são cortados uma ou duas vezes com ganchos grossos. Nesse momento os golfinhos produzem um som estridente bem parecido ao choro de um recém-nascido."
Tais frases deviam contribuir muito para a revolta das pessoas que viam as imagens, o que é natural.

É chato dizer isto, mas a verdade é que aqueles que, talvez até demonstrando uma boa vontade, pularam de indignação contra as imagens do "massacre" erraram um pouco o alvo. O abate dos golfinhos é um evento cuja principal função é guardar a carne do animal para o rigoroso inverno nas Ilhas Faroe.

A parte de o abate ser como que um rito de passagem não é comprovada. Mais informações sobre o que realmente acontece podem ser vistas aqui e aqui.

Mas o que é que um assunto destes tem a ver com o aborto, o principal tema deste blog? Aparentemente nenhum... Mas quando ficamos sabendo que a mensagem foi enviada por uma pessoa que milita pela liberação do aborto a coisa muda de figura. E milita ao ponto de seu e-mail -- que não vou divulgar, claro -- fazer referência exatamente à descriminalização do aborto.

E a coisa fica mais tragicamente irônica quando no corpo da mensagem lemos frases como "os golfinhos produzem um som estridente bem parecido ao choro de um recém-nascido" para indicar o sofrimento dos animais abatidos.

Mas é forçoso dizer que uma defensora do aborto horrorizar-se com a morte dos golfinhos, e de golfinhos que emitem sons de "choro de um recém-nascido", não é coisa que me surpreenda. Aliás, posso dizer que é típico mesmo de tais pessoas este tipo de horror seletivo.

Um horror tão seletivo que é capaz de relativizar a vida de seres humanos ainda não nascidos, mas que rasga as vestes quando vê o abate de golfinhos que apenas serviriam de alimento.

É um horror artificial, que se importa muito com quantos golpes morre um golfinho nas Ilhas Faroe, mas que nem liga para o triturador encontrado em clínicas de aborto no Rio de Janeiro e que era utilizado para eliminar as evidências de um crime bárbaro e cruel contra seres humanos em estágio frágil.

É um horror falso, que acha bem pouco civilizado quem mata golfinhos para comer, mas que aplaude de pé médicos que são capazes de matar dois pequenos e frágeis seres humanos, fazendo-os pagar com a morte pelo crime de seu pai.

É um horror que nos horroriza porque humaniza golfinhos e animaliza seres humanos, da mesma forma que nem se importa que ovos de tartaruga sejam protegidos enquanto procura-se a legalização do aborto de seres humanos.

Este é o tipo de horror que podemos esperar de quem se dói que os faroenses comam carne de golfinho, mas que acha um absurdo que não seja seu direito que seu filho vá parar em um triturador de carne.

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